Conteúdo do impresso Edição 1320

FIM DA LINHA

Oficial de Justiça é demitido por fraude em esquema que levou à aposentadoria compulsória de juíza

Caso faz parte de investigação que culminou na punição da juíza Emanuela Porangaba
Por José Fernando Martins 21/06/2025 - 06:00
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Oficial de Justiça é demitido por fraude em esquema que levou à aposentadoria compulsória de juíza
Oficial de Justiça é demitido por fraude em esquema que levou à aposentadoria compulsória de juíza

Conselho Estadual da Magistratura de Alagoas decidiu, por unanimidade, demitir o oficial de Justiça Ednor Emídio da Costa Lima Gonzaga Júnior, após comprovação de que ele forjou um endereço para manipular a distribuição de um processo judicial. A decisão, publicada em 4 de junho, ganha ainda mais relevância porque o caso de Ednor está diretamente ligado ao escândalo que resultou na aposentadoria compulsória da juíza Emanuela Bianca de Oliveira Porangaba.


A punição à magistrada foi imposta pelo Pleno do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) no dia 20 de maio deste ano, por 9 votos a 6, após a constatação de que ela favoreceu sistematicamente o escritório Mousinho & Mousinho Advogados Associados enquanto atuava como juíza substituta em várias comarcas, entre 2022 e 2024. Relatório da Corregedoria Geral de Justiça apontou que Emanuela proferiu decisões em série beneficiando o mesmo grupo jurídico em pelo menos 16 processos com padrão repetido, envolvendo inclusive o uso de endereços falsos para direcionamento de ações.


O caso específico de Ednor veio à tona após uma inspeção da Corregedoria Geral da Justiça na Vara do Único Ofício de São Luís do Quitunde, comarca onde Emanuela atuava à época. Em dezembro de 2022, o oficial de Justiça ajuizou uma ação contra o Banco de Brasília (BRB), declarando como seu endereço residencial um imóvel inexistente: número 56 da Rua José Alurindo, no Centro da cidade. O nome da rua, na verdade, é José Laurindo dos Santos, e não há imóvel com aquela numeração no local.


Além disso, investigações mostraram que outros três autores, representados pelo mesmo escritório de advocacia, usaram o mesmo endereço para ajuizar ações na mesma vara, também com tramitação anormalmente rápida. A prática de inserção de endereços fictícios foi apontada como estratégia para direcionar os processos à magistrada, prática que ficou conhecida dentro do Judiciário alagoano como “calote institucionalizado com apoio judicial”. Entre os casos que ilustram o esquema, destaca-se uma ação contra a BMW Financeira S.A., também marcada pelo uso de endereço falso.


Ednor, que como oficial de Justiça tinha a obrigação legal de atestar a veracidade de endereços em processos judiciais, alegou em sua defesa que havia se mudado temporariamente para São Luís do Quitunde por questões pessoais. Disse ainda que alugou o imóvel de forma verbal e que permaneceu na cidade por no máximo duas semanas. No entanto, diligência feita por outro oficial de Justiça comprovou que o endereço nunca existiu, e que nenhum dos moradores da rua conhecia o servidor, da mesma forma que não conheciam os autores dos demais processos em que foi utilizado o mesmo endereço.


A Corregedoria destacou ainda que apenas sete dias após ajuizar a ação em São Luís do Quitunde, Ednor moveu outro processo, desta vez na Comarca de Maceió, declarando como domicílio o endereço onde ele reside há cerca de uma década. O relator do caso, desembargador Celyrio Adamastor Tenório Accioly, reforçou que o servidor buscou obter favorecimento judicial ao manipular informações com o objetivo de alterar a competência territorial do processo, violando assim o princípio do juiz natural e a moralidade administrativa.


A decisão considerou que, mesmo a conduta não tendo ocorrido durante o exercício das funções típicas de oficial de Justiça, o ato foi grave o suficiente para comprometer a imagem e a credibilidade do Poder Judiciário. As provas apontaram que o servidor não apenas forjou o endereço na petição inicial, mas também inseriu o mesmo endereço inexistente na procuração concedida ao seu advogado.


Além da demissão, o caso de Ednor será encaminhado ao Ministério Público Estadual para apuração de responsabilidade criminal por falsidade ideológica, prevista no artigo 299 do Código Penal. Paralelamente, a OAB de Alagoas também foi acionada para investigar a conduta ética dos advogados envolvidos no esquema de direcionamento de ações. O caso segue repercutindo no meio jurídico alagoano, com o Tribunal de Justiça reforçando que novas medidas podem ser adotadas caso outros servidores ou magistrados venham a ser implicados.


Ednor Gonzaga foi presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de Alagoas (Serjal) por dois mandatos, de 2009 a 2014. Em 2015, ele foi denunciado pelo Ministério Público pelo crime de peculato, acusado de desviar recursos da entidade de classe que culminaram em um prejuízo de R$ 498.611, tendo firmado acordo de não persecução penal.


Lotado na Vara Única da Comarca de São José da Laje no cargo de analista judiciário-oficial de justiça avaliador com salário base de R$ 15.562,43 e indenizações mensais de R$ 1.232 de auxílio alimentação, R$ 900 por plano de saúde e R$ 2.668,14 de auxílio transporte, Ednor Gonzaga recorreu ao Pleno do TJ contra a demissão. O recurso, que ainda vai ser analisado, tem como relator o desembargador Márcio Roberto Tenório.


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